sexta-feira, 11 de junho de 2010

Comunicação nas empresas a partir das pessoas


Divulgar não é comunicação. Apenas cumpre a função de informar. Informação é um processo passageiro, efêmero, que carece de maior consistência para que o processo de decodificação possa ser internalizado na memória da audiência. Divulgar apenas não internaliza. Somente causa um impacto momentâneo, superficial, que ficará disperso na memória da audiência, bastando que outra mensagem desperte sua atenção, logo em seguida, para que a mensagem divulgada anteriormente seja pulverizada e se perca na memória das pessoas, em pouco tempo. Comunicar é processo. Divulgar é intervenção. Comunicar tem algo a ver com vivenciar, experimentar e testar a práxis da promessa divulgada. Para que a divulgação se consolide e se transforme em comunicação demanda tempo de decantação.


Além disso, a eficácia da comunicação também depende da habilitação da sua fonte, ou seja, mais que o conteúdo divulgado, a reputação da fonte reforça a promessa e faz com que a audiência não crie parti pris e neutralize a mensagem antes até que ela seja finalizada. Uma fonte também carece de tempo para consolidar a sua imagem de confiabilidade. Por isso, ela também não será dispensada da prova de confirmação na prática do discurso, até porque as audiências já trazem consigo um ar de desconfiança diante de tantas promessas não cumpridas, fora ou dentro das empresas. Uma terceira variável torna-se fundamental para que a divulgação se consolide e resulte em comunicação: o clima de confiança prevalecente dentro do ambiente-alvo em que a comunicação é gerada e transmitida.


Não é outro o motivo da grande frustração das empresas quando percebem que a relação investimento/resposta em comunicação se comporta de forma inversa, frustrando o razionale esperado, ou seja, quanto maior o investimento na comunicação maior o recall sobre a audiência-alvo. Para que o razionale da comunicação obtenha resultados progressivos há que se investir também no comportamental dos líderes envolvidos no conteúdo a ser comunicado. Eles serão os principais veículos da comunicação, na medida em que cumpram a promessa declarada por eles mesmos, no dia-a-dia das suas ações e decisões.


Neste contexto, há que se considerar também que as pessoas tendem a processar de forma diversa as mensagens que recebem, mesmo que elas sejam divulgadas de modo padronizado e em veículos adequados. Isto porque elas decodificam as mensagens que recebem de acordo com as suas próprias convicções e interesses, até porque a incorporação da mensagem pela audiência-alvo se realiza por associações simbólicas entre os conteúdos divulgados e os padrões de valores pessoais que cada um dos ouvintes incorporam, de modo consciente ou inconscientemente. É o que os psicólogos denominam de ignorância seletiva, ou seja, um comportamento em que os indivíduos interpretam os fatos com uma visão coerente com o que lhes é conveniente. Observe-se que esta conveniência não é somente processada de modo consciente.

Carl Roger (1980) reforça este conceito quando acentua que a necessidade de manter o seu próprio conceito (self ideal) é tão forte nos indivíduos que eles negarão ou distorcerão experiências e comportamentos próprios que possam contradizer o seu autoconceito. Aliás, este mesmo fenômeno fora trabalhado por Carl Jung (1936) que o denominou de “sombra humana”, ou seja, traços da personalidade do indivíduo que, por não estarem em conformidade com o status quo da realidade consciente, são rejeitados por ele próprio a nível consciente, mas que estão incorporados na sua personalidade. Dessa forma, parece-nos fundamental que qualquer plano de comunicação interna leve em conta estas variáveis não-visíveis que norteiam o comportamento das pessoas, sob pena de sofrer ruídos constantes e incontornáveis dentro das empresas.

O próximo passo para se desenhar um plano de comunicação interna mais consistente seria mapear as “verdades” que circulam nos corredores das empresas, através das redes sociais de comunicação informal, e cotejá-las com o discurso oficial da organização. Aí está a essência para a construção de um processo de comunicação a partir das pessoas.

João Quadros


João Quadros é Doutor em Comunicação, Mestre em Administração de Empresas, pela American University, Especialista em Marketing, pela ESPM e Professor Adjunto da Escola Administração da UFBA.


Fonte: artigo publicado na Associação Brasileira de Agências de Publicidade Capítulo Bahia (Abap-Ba)

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